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    sábado, 7 de março de 2009

    Quem quer ser um ganhador de Oscar?

    ou "Ensaio sobre a expectativa" ou "A importância de se fazer um filme ruim de vez em quando"



    "Slumdog Millionaire" (por que não batizá-lo de "O Milionário da Favela"? ficaram com medo de ver favelados indo pro cinema?) estreou nos cinemas brasileiros nesta semana, já depois de ganhar todos os principais prêmios da indústria cinematográfica, incluindo impressionantes 8 Oscars. Uau, então deve é um filmaço, né? Mais do que isso, um clássico moderno, um acontecimento...

    Sim, o filme é excelente. Mas se assistí-lo esperando ver um "Cidadão Kane" dos anos 2000 vai se estrepar. Imagine que não é nem o melhor filme do diretor Danny Boyle - vamos combinar, "Trainspotting" sim, esse é um clássico.

    Mas por que então tanto oba-oba nesse filme?


    O filme se deu bem porque apareceu quando ninguém esperava. Danny Boyle, o diretor, ganhou o Oscar não somente porque seu filme é bom, mas porque o seus últimos filmes eram uma merda e baixaram drasticamente as expectativas de todos quanto ao seu trabalho. Quando fez "Trainspotting", na década de 90, ele se tornou a bola da vez. Mas pouco depois ele cometeu "A Praia", filme mais ou menos que todos queriam que fosse genial e acabou queimando o filme. "Sunshine", seu último filme, era uma ficção científica sem sentido, ruim mesmo. "Slumdog Millionaire" apareceu quando ninguém estava nem aí pro cara, e acabou acertando no milhar.

    Boyle acertou também porque fez um filme "diferente", mas que vem quando vários filmes "diferentes" já acostumaram a indústria à esse tipo de filme. "Cidade de Deus", queira ou não queira, foi o filme que amaciou o eleitorado do Oscar pros filmes pop da favela. Não fosse o filme brasileiro, "Slumdog" não ganharia um décimo dos seus
    prêmios.



    Aliás, o diretor do "Cidade de Deus" acabou sofrendo o efeito contrário do "Slumdog Millionaire". No ano passado Fernando Meirelles fez o "Ensaio Sobre a Cegueira", ótimo filme, mas que veio cercado de tanta expectativa que acabou virando um fracasso. Tivesse sido lançado após meia dúzia de desventuras cinematográficas, o filme estrearia com menos holofotes, e possivelmente surpreenderia muita gente.

    São episódios assim que comprovam uma teoria que eu sempre tenho: a qualidade de um filme (ou de um disco, ou de uma peça) nunca é algo absoluto. A tua satisfação com o filme é na verdade uma média complexa entre a sua expectativa quanto ao filme, misturado com as críticas que você leu antes, os comentários que os amigos fizeram, a época que você vê o filme, a sua vontade de fazer xixi, a quantidade de sono que você teve no dia anterior, a sua relação com a sua namorada naquele dia, a qualidade da projeção, da legendagem, o tipo de compania que você tinha, a sua preocupação com o trabalho, o tamanho da fila do cinema, a qualidade da pipoca e quaisquer outros fatores que o cara que fez o filme nunca vai poder controlar.

    Por mais que os Oscars da vida te digam o que é bom e o que não é, não te deixem definir o que você pensa, ok?



    P.S.: Engraçado que, na minha humildíssima opinião, o melhor filme dessa leva do Oscar é "O Lutador", que vem de uma trajetória bem parecida com a do "Slumdog Milionaire". O diretor, Darren Aronofsky, bombou uma vez com o filmaço pop sobre drogas "Réquiem para um sonho" (que tem muito a ver com "Trainspotting"). Mas logo em seguida cometeu um dos piores filmes que eu já vi, a tenebrosa superprodução "Fonte da Vida". Quando ninguém esperava nada dele, ele se juntou a atores que também estavam na merda (Mickey Rourke e Marisa Tomei), mudou seu estilo e fez um filme absolutamente surpreeendente, que só podia ser dirigido e interpretado por gente que conhece a derrota.

    Tem hora que o melhor é mesmo manter as expectativas alheias bem baixas...

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